Nesta última década, as coisas mudaram muito para Miguel Soares, um ilustre cidadão de Leiria que só em 2012, “aliciado pelo pessoal do NEL Pédatleta”, começou a mexer as pernas e correr.
“Pesava muito” e o desporto não era propriamente para ele. Mas tudo se transformou. Hoje, a corrida “é um modo de vida” e tem “dezenas” de provas concluídas entre os 100 e os 160 km de extensão.
Destaca, ainda assim, os mais de 300 km da Algarviana Ultra Trail, os quase 300 km da PT281+, os 160 km da Oh Meu Deus e os 6.500 metros de desnível positivo nos 73 km da Travesera Picos de Europa.
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Para 2023, Miguel Soares assumiu como objetivo primordial realizar a Race Across Scotland 215 Mile. Feitas as conversões, são 355 km pelo “trilho sumptuoso” do Southern Upland Way, atravessando a Escócia de costa a costa, do Oceano Atlântico até ao Mar do Norte, com 100 horas para concluir o trajeto.
E no dia 10 de agosto lá estava ele na linha de partida para enfrentar penhascos, pastagens, charnecas, florestas, colinas, rios enormes, muito vento, chuva e mais chuva.
Era difícil evitar. Rapidamente, a lama tomou posse de todos os terrenos e a progressão tornou-se num “calvário”. Foram “quilómetros de marcha com as sapatilhas enfiadas dentro de água lamacenta e um nevoeiro cerrado. Rajadas consecutivas de vento provocavam sensações desconfortáveis de frio” conta Miguel Soares.
Com os pés a “fervilhar de dores”, “enfaixados em Leukotape”, depois de “dezenas de quilómetros submersos”, pensou desistir. Mas seguiu, sempre, rumo à meta. Foi conhecendo “companheiros de aventura diferentes, de várias nacionalidades”, que o foram apoiando com frases tão simples quanto poderosas, como “tu consegues, não há pressa, vai em frente”.
A privação de sono foi outro adversário. Nas 97 horas que levou a concluir a prova, dormiu apenas quatro. “O caminho tornou-se num sonho mágico, não me recordo de quase nada desse período, a não ser que dormi várias vezes em pé, cambaleando pelo trilho e miraculosamente despertando sempre que parecia estar a cair.”
Mas chegou à meta e ultrapassou “um objetivo ao alcance de muitos poucos”: percorrer mais de 200 milhas. Dos 150 inscritos no “itinerário mais belo e singular” que realizou, terminaram 57. Miguel Soares ficou no lugar 50.
“Que grande aventura” foi. Uma lição de vida que garante que somo nós que trilhamos o nosso próprio caminho. “Nada é impossível. A questão é se querem mesmo e o que estão disponíveis a fazer para o alcançar.”
Na lista de afazeres segue-se o Moab 240 , no Utah, e um “sonho de vida” que há muito está a ser planeado: percorrer os 3.500 km do trilho dos Apalaches, também nos Estados Unidos. Onde é que isto vai parar? Isto não vai parar.
Foto principal: Evan Davies Photos