O projeto desenvolvido por um docente do Politécnico de Leiria, que pretende estudar o impacto da prática do surf em pessoas com deficiência intelectual, chegou ao fim, com nota máxima de felicidade para os utentes de uma instituição.
Pouco passava das 15 horas de terça-feira, quando cerca de uma dezena de utentes da Organização de Apoio e Solidariedade para a Integração Social (Oásis), de Leiria, entraram no mar de São Pedro de Moel para a sua última aula do projeto SurFeliz, do mestrado de Miguel de Bastos André, que também é professor da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Politécnico de Leiria.
A alegria era contagiante, mas sem saltar passos. Antes de se lançarem ao mar para apanhar as ondas, recordaram as recomendações de segurança e as técnicas para se conseguirem equilibrar na prancha.
A lição estava bem consolidada e todos se lembravam bem dos ensinamentos do último encontro. Com ondas que facilitavam a aprendizagem do surf, os utentes entraram felizes no mar, prontos a cavalgar as ondas. Manter-se de joelhos em cima da prancha já era uma vitória para muitos, uma conquista sempre muito festejada por todos.
Além da boa disposição, o espírito de grupo esteve sempre na água, com incentivos constantes entre os utentes e os monitores.
A felicidade dentro de água não deixava indiferente quem passeava no areal, que desconhecia que em cima das pranchas estavam pessoas com deficiência intelectual, que se superaram a cada momento.
Os mais ágeis conseguiram mesmo surfar as ondas de pé e até os mais velhos mostraram destreza em cima da prancha.
“Gostei muito de participar. Ao início era mais difícil, mas depois já se consegue. Hoje era o último dia e tinha de rebentar. Queria chegar até ao fim”, afirmou, cansado, Hildeberto Macedo, 28 anos, utente da Oásis.
Durante oito semanas, cerca de duas dezenas de utentes daquela instituição foram surfistas, num projeto académico, que pretende ser o mote para uma intervenção na comunidade.
Miguel de Bastos André, professor da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Politécnico de Leiria, está a realizar um mestrado e quis avaliar cientificamente o impacto do surf na felicidade e no bem-estar de pessoas com deficiência intelectual.
No ano passado, quando a Oásis o contactou, estava a entrar no segundo ano do mestrado, “com a intenção de fazer um estudo que pudesse dar algum fundamento científico à ideia de que o surf traz felicidade”.
Aquilo que seria a tese de mestrado transformou-se num projeto de intervenção comunitária, unindo sinergias “para que todos saíssem a ganhar”.
“Este é um projeto-piloto que vai servir de base para algo que se desenvolva ao longo de todo o ano e que consiga criar postos de emprego para técnicos, que sejam formados na área do desporto e na área da atividade física, com populações especiais. A ideia é conseguirmos que isto seja financiado pelas empresas”, revelou Miguel de Bastos André.
Ainda sem os resultados finais, o docente constatou que o desenvolvimento dos utentes tem sido “muito forte”.
“Tínhamos uma aluna que no início nem sequer queria molhar os pés e conseguimos pô-la de pé na prancha”, contou.
“Uma das nossas missões é fazer as pessoas felizes. Ou seja, ser uma fábrica de sorrisos. Aqui vimos sorrisos genuínos. É uma coisa que se sente. Temos outras atividades, mas nenhuma teve tanto impacto na vida deles como esta. É pura alegria”, constatou o professor de Educação Física e coordenador do Centro de Atividades e Capacitação para a Inclusão da Oásis, Bruno Mourinha.
Quando chegam à instituição, os utentes vão mais cansados, mas também “mais alegres e mais desenvoltos”.
“Houve pessoas que nunca tinham mergulhado no mar e tínhamos grandes dificuldades em as levar à piscina. Aqui entram, estão lá, mesmo que chova, continuam”, revela Bruno Mourinha, que lamenta não poder levar todos os utentes da Oásis, incluindo quem tem mobilidade reduzida.
“Não sei que resultado o estudo irá dar, mas aquilo que eles já ganharam, e nós, ao ver a satisfação deles, já por si, é mais do que suficiente para ficarmos todos felizes”, reforçou Miguel de Bastos André, ao salientar que a “ideia é poder levar para a comunidade os benefícios daquilo que se está a estudar no mundo académico”.
O docente pretende reeditar estas oito semanas no próximo ano, para em 2023/2024 tentar arrancar com um projeto bianual.