O sorriso de António Rolla ou o árbitro que oferece harmonia ao andebol

De uma coisa temos a certeza absoluta. Sempre que António Rolla arbitrar um jogo de andebol, as regras vão ser cumpridas a preceito.

Foi precisamente isso que aconteceu este domingo, no pavilhão da Batalha, no jogo de minis entre o Batalha AC e a SIR 1.º de Maio, numa missão que partilhou com a jovem Helena Pacheco.

Focado, com gestos perfeitos e sinalização adequada, advertia as treinadoras se elas pisavam a linha lateral e corrigia o local das faltas ou dos foras se marcados para lá do sítio correto.

Também não tem pejo em marcar um livro de sete metros sempre que a situação se justificava. E não, não houve exclusões por dois minutos, mas porque os atletas se portaram mesmo bem. Com o António, dura lex, sed lex. “Gosto de fazer cumprir regras”, justifica.

Aos 24 anos, integra pela primeira vez os quadros da Associação de Andebol de Leiria. No entanto, a paixão pela modalidade, mas sobretudo por arbitrar, vem de longa data.

Foi a partir do 7.º ano, com a professora Paula Virgolino – a que “mais gostou” em todo o percurso escolar – que aprendeu a gostar de andebol.

A paixão pela arbitragem chegou antes, no 5.º ano da Escola José Saraiva, em Leiria, através das ações do professor António Violante, que decidiu colocá-lo a ajuizar.

“Foi uma maneira de o professor o integrar, valorizando as capacidades do António”, explica-nos Maria Ana, a mãe.

O António é autista.

“Regras é com ele e os colegas adoram isso, porque, se for preciso, o António expulsa a mãe, antes de qualquer um. Ele não toma partido, seja qual for a equipa.”

Chegou à Associação de Andebol de Leiria por intermédio da psicóloga, Susana Lalanda, que perguntou aos responsáveis se havia possibilidade de o rapaz tirar o curso de arbitragem e integrar o quadro de árbitros. A presidente, Ana Patrícia Dinis, colocou-lhe uma passadeira vermelha.

Foi uma felicidade sem fim. Em novembro fez o curso, ficou apto, fez o exame médico e foi inscrito. No dia 2 de abril, em Alcobaça, arbitrou pela primeira vez. “Por acaso gostei”, conta-nos.

Seguiu-se o Nazaré Cup. Quatro dias de prova, oitenta equipas em competição e o privilégio de arbitrar a intensa final de minis femininos.

“Treinadores, árbitros, dirigentes e atletas, todos o receberam impecavelmente. Ninguém protestou, foi fair play ao máximo. E ele decide bem, sem qualquer problema de apontar sete metros ou dois minutos”, explica Ana Patrícia Dinis.

“Foi espetacular. Recebi imensos elogios, tanto de portugueses como de espanhóis”, murmura António, de sorriso feliz. E o que mais se pode querer do que um árbitro elogiado?

Por enquanto, nas suas funções, António ainda conta com o apoio de um terceiro árbitro na linha, que o vai ajudando a gerir o jogo. É, tão só, Eurico Nicolau, árbitro internacional que está “encantado” com o pupilo.

“Assim que ouve capta imediatamente. A seguir quer faz bem e olha à procura do reforço positivo. Logo a seguir, já não precisa desse contacto visual. Tem confiança, absorve tudo e gosta de aprender”, sublinha o juiz.

“Ainda custa a acreditar que é mesmo a sério, que não é apenas uma experiência. Ele até recebe prémios de jogo! É muito estranha esta sensação de chegarmos a um sítio e ninguém nos levantar um problema pelo facto de ele ter autismo”, admite Maria Ana Rolla, feliz por ter sentido, sempre, as portas da Associação de Andebol de Leiria “escancaradas”.

E a verdade é que ninguém fica indiferente ao António. Seja no trabalho, no departamento de logística da la Redoute, onde ganha o seu ordenado e se torna independente, ou no andebol. Simpático com os miúdos, espetacular nos relacionamentos como todos os outros agentes desportivos, a presença deste árbitro pode fazer maravilhas e trazer mais paz ao andebol.

“Não consigo descrever esta satisfação”, explica a mãe. “São pedacinhos do céu. É uma harmonia, onde cada um está no seu lugar, sendo respeitado e amado como é, podendo retribuir da mesma forma.”